Na entravista, João Adibe conta que começou a atuar como vendedor de beós aos 18 anos nos anos 1980, no pequeno laboratório do seu pai em São Paulo. Ele visitava as farmácias com uma pasta ao estilo 007 com o catálogo que não passava de uma dúzia de produtos. Leia trechos ipsis litteris da transcrição:
“Eu fiz parte dessa geração de vendas, que é a raiz do negócio de vendas e que até hoje esse negócio funciona muito bem. E os vendedores da Cimed sempre venderam mais do que eu pedi. Isso foi uma coisa que sempre me desafiou: acho que é um pouco do DNA da empresa que tenho hoje! (‘Como que é? Traduz isso pra mim?’, diz o entrevistador) Não ter limite! A cota (a meta de venda dos vendedores do Cimed) é só para o vendedor ter uma diretriz, mas ele sempre tem que vender mais do que a cota! Isso deixa a empresa nervosa, quente! A empresa vai crescendo, crescendo… Tem profissionais que se adaptam, tem profissionais que não se adaptam… Eu sou um vendedor! Sempre tive facilidade nesse negócio e cobro isso da minha equipe de vendas!” O entrevistador do podcast pergunta ao dono da Cimed como a empresa se destaca nos balcões das farmácias em meio a tantos correntes. A resposta revela bem o senso ético do empresário que representa grande parte dos genéricos e similares bonificados que abarrotam as prateleiras das farmácias:“O principal é porque a Cimed não é uma indústria de medicamentos! A Cimed é uma empresa de vendas que por acaso tem uma indústria de medicamentos! Outro fato importante é porque todo genérico é intercambiável por lei! E o genérico pode ser substituído na receita. Se o cara vai no médico e o médico receita o medicamento X, ele chega na farmácia e o balconista pode trocar pelo genérico. O brasileiro é o cara do preço! Aí ele pergunta: ‘Ah, quanto custa esse da receita?’ ‘Custa cento e vinte’ (ele arremeda ao mesmo tempo o consumidor otário e o balconista espertalhão) ‘E o genérico?’ ‘Trinta!’ Aí você me pergunta (se dirigindo ao entrevistador): ‘Peraí?! (sic) Cento e vinte contra trinta’ Aí você já fica veaco (sic) com o médico que te receitou né?! ‘Peraí? (sic) Eu fui no médico e o cara me receitou um remédio de 120 reais, mas o balconista me ofereceu outro remédio de 30?!’ (Mas por que tem uma diferença de preço tão grande?, pergunta o entrevistador) Aí o balconista tem que endossar isso! Aí ele vira pra você e diz: ‘Olha, tem essa marca, essa marca e essa marca!’ Todos têm o G na caixinha! Então existe o que? Existe uma guerra de balcão! E como eu ganho essa guerra? Na pressão de prateleira! No volume! Isso significa que quanto mais eu vender mais eu vou ser visto! E automaticamente eu vou dominando aquela categoria através da pressão no balcão da farmácia! Coloca o concorrente para o lado e vai! (E como você faz isso?, pergunta o entrevistador) Presencialmente! (Como assim?, pergunta o entrevistador) Aí que a gente se destaca! Hoje temos a maior força de vendas do Brasil hoje. Tenho cerca de 1.300 vendedores visitando diariamente 8 mil farmácias nesse brasilzão (sic) profundo. A partir de 250 reais eu entrego em qualquer lugar do Brasil! Quando as pessoas me perguntam o que é a Cimed e eu respondo: A Cimed é uma empresa de vendas que tem uma indústria farmacêutica! Vendas em primeiro lugar! Sem vendas, eu posso falar de coração que você está fodido!”Em outra entrevista, João Adibe diz foi vendendo remédios para o pequeno laboratório do pai que descobriu que tinha DNA para o negócio: “Foi correndo de farmácia em farmácia que vi que tinha uma puta oportunidade, porque quanto mais eu vendia mais ganhava. E não tem coisa melhor em vendas, né? Quando mais vende mais ganha! É isso a chama do negócio! Então hoje eu falo que a Cimed é uma empresa de vendas que tem uma indústria farmacêutica!”Na entrevista a outro podcast João Adibe confessa a política comercial e a gana da Cimed pelas metas de venda: “Eu sou um vendedor, não sou um CEO, esse é um grande ativo que eu aprendi lá atrás! Eu sou vendedor e cobro vendas do meu grupo! O pau come o dia inteiro na empresa. É por isso que eu falo: o vendedor que vem trabalhar na Cimed tem que entender a nossa cultura. E tem pessoas que não querem entender! A cultura dos vendedores é o principal para saber se vai ter identificação comigo e com a minha empresa. A gente tem que falar a mesma linguagem de vendas. Foi essa cultura de vendas que ascendeu a nossa empresa! Eu implantei na Cimed a cultura da cota de vendas, porque vendedor sem cota não funciona! Mas além da cota de vendas eu implantei na empresa a cota moral, que funciona assim: se a conta do vendedor é cem mil a cota moral é cento e vinte mil! Que é pra ele sempre vender mais do que a cota. E aí movimenta toda a estrutura da empresa, o negócio rola quente! Por isso que eu friso sempre: a Cimed é uma empresa de vendas que tem uma indústria farmacêutica! Vendas sempre! Na Cimed as vendas está em primeiro lugar de tudo! A gente não conversa se não tem vendas! Por exemplo a comissão: até hoje eu sou um cara que gosta de olhar o relatório de vendas dos nossos vendedores. Eu só olho o relatório de quem está ganhando pouco porque é ali que está o buraco! Aí você analisa a liderança de quem contratou ele, você já vê que é uma liderança errada no conceito de vendas. Por que na equipe dele têm dez caras que batem as metas e tem um que não bate? Qual é o trabalho desse líder de vendas, qual o papel desse líder para transformar e treinar essas pessoas? É aí que está o negócio. Se tem o cara que vendeu 120 e tem o cara que vendeu só 80 eu chamo o líder de vendas. Tô cagando pro cara que vendeu 120! Eu chamo o líder de vendas e digo: é o seguinte, cobra explicação do cara que vendeu só 80 mil. Mostra pra mim qual foi o B.O. Pra ser vendedor da Cimed tem que ter tesão e senso de vencedor! Não tem jogo perdido, é pau toda hora! Se o cara está parado, não está vendendo, se está atrasando a empresa, tiro esse cara da nossa vida! Se você acorda de manhã e diz: ‘Nossa, aquele cara não vende porra nenhuma!’ Por que você tem um peso morto do teu lado? Tira aquilo, meu! Tira da tua vida! Sai daqui, some! Aí se o líder de vendas ficar pensando o dia que vai mandar cara embora. Ele é doente? É literalmente doente!”Eita, ainda bem que não compro nem aceito nenhum genérico de caixinha amarela fornecido nas farmácias do SUS ou pelo sistema Farmácia Popular!O Lavitan é o carro-chefe do portfólio de produtos Cimed, vendido nas pequenas e grandes farmácias do Oiapoque ao Chuí, ou, como gosta de dizer João Adibe, nas grandes cidades e no Brasil profundo: “Para cada dez vitaminas vendidas nas farmácias, quatro é Lavitan”, diz com orgulho no fodcast da vida! “Em 2012 o mercado de vitaminas caiu 10% e a Lavitan cresceu 55%! A Lavitan cresceu porque na hora que o mercado desacelerou eu acelerei!”O Lavitan é destaque em promoções e campanhas na maioria das farmácias. O Lavitan possui um stand próprio na entrada das grandes farmácias para a apresentação do produto que já possui mais de uma dúzia de variações e apresentações. O Lavitan ocupa primeiro lugar no ranking de vendas. O Lavitan também ocupa o ranking de queixas no Reclama Aqui, conforme seque abaixo destaque para algumas delas:“Tomei o Lavitan e após alguns dias comecei sentir dores fortes no estômago e diarreia…”“O farmacêutico leu toda a bula do Lavitan e disse que eu ia ter mais disposição e energia mas tomei por 15 dias e tinha sono o tempo todo…” “O Lavitan deixou a minha boca amarga e muito seca, diarreia, dor de cabeça fortíssima, vômito, fraqueza, tremedeira e mal estar…”“Tomei Lavitan por 4 dias e tive um sangramento nas fezes. Parei de tomar e não houve nenhum outro episódio igual…”“Tomei o Lavitan A-Z e comecei a sentir dores no estomago do nada, coisa que nunca tive…“Comprei o Lavitan Memória e os comprimidos estão rachados e com mal cheiro…”“Comprei o Lavitan com 60 cápsulas e o frasco estava quase vazio, contei e só tinha 31 cápsulas…”“Tomei o Lavitan Memória e senti muitas dores de estômago…”Muitos empresários e farmacêuticos desonestos copiam Cristo e também fazem o milagre da multiplicação. Só que no caso específico do setor farmacêutico —e isso acontece muito em farmácias de manipulação e laboratórios de fundo-de-quintal que fabricam beós— ocorre a multiplicação do princípio ativo.Por exemplo durante as investigações para escrever o meu primeiro livro trabalhei em uma farmácia em Alfenas (MG) cujo farmacêutico proprietário também dono de um pequeno laboratório que falsificava medicamentos. Na conversa que gravei, o funcionário revela como multiplicavam 100 caixas de Psicosedin em 1.000 caixas de Diazepan:— E a falsificação de Diazepan, como acontece?— Ele (o farmacêutico dono do laboratório) compra 100 caixas do Psicosedin, que a fórmula é diazepam e custa mais barato, coloca na máquina pra moer e mistura com amido. De 100 caixas de Psicosedin ele fabrica mil caixas de Diazepan! Ele também falsifica a Alcachofra. Ele transformavam Alcachofra comum em Alcachofra Composta. Só que o remédio é o mesmo. Só aumenta a quantidade de comprimidos e muda a embalagem! Aquilo lá é uma zona! É só pra ganhar dinheiro mesmo!E a Anvisa sabe que os fabricantes nacionais de genéricos e similares são dependentes do insumo importado de outros países, principalmente a China e Índia. No Brasil existem mais de 300 laboratórios entre os pequenos desconhecidos, os nacionais de porte médio e os grandes multinacionais. Mais de 80% compram os fármacos do mercado chinês porque sai muito mais barato do que fabricá-los no Brasil. O problema para o consumidor é que a Anvisa não fiscaliza a importação nem testa a qualidade desses produtos.O médico, coordenador da Sobravime e doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP) José Ruben de Alcântara Bomfim estudou profundamente os meios de importação dos princípios ativos utilizados pelas indústrias farmacêuticas brasileiras e constatou muitas irregularidades.“Praticamente 80% das matérias primas utilizadas no Brasil são importadas na China ou Índia, países onde existem empresas oferecem produtos não muito confiáveis com preços imbatíveis. E sabemos que muitos desses produtos entram de forma irregular no país. E posso dizer isso porque estudei profundamente o processo de importação desses produtos e sei que não passam por nenhuma fiscalização ou teste para saber a origem e qualidade. Então como é que se pode garantir que os similares e genéricos, mesmo que supostamente sejam considerados intercambiáveis, tenham a qualidade dos medicamentos de referência quando não se sabe nem a origem da matéria-prima utilizada na sua produção? E principalmente quando sabemos que não foi feito um acompanhamento da importação e da forma de utilização pelos laboratórios! Isso é um verdadeiro atentado à saúde pública. A autoridade sanitária brasileira não conhece a origem da matéria-prima utilizada na fabricação de medicamentos! Então é muito possível que grande parte entra ilegalmente no país e estão sendo utilizadas por indústrias farmacêuticas que não são idôneas. Isso é um crime e é preciso que o paciente consumidor de modo geral tenha conhecimento disso!”Qualquer um que mesmo superficialmente pesquisar sobre fraudes em medicamentos no Google vai perceber que o setor farmacêutico braseiro não é nada confiável!Enquanto isso, tirando vantagens da ignorância da população, o CEO de sangue amarelo da Cimed —como o bom vendedor que é— investe maciçamente nas redes sociais para influenciar, ou melhor, enganar os otários consumidores de medicamentos.Em um trecho das suas mesmíssimas propagandas aos podcasts ele ressalta: “A Anvisa é um órgão que regulariza muito! Então não vamos discutir eficácia de medicamentos! No Brasil existem mais de 300 indústrias farmacêuticas e quem fabrica medicamentos no Brasil é top! Todos os nossos concorrentes que estão fabricando medicamentos não dependem de ninguém no mundo! Então eu não discuto a qualidade de genérico! Quando se trata de medicamento, a qualidade é obrigação!”No entanto, o especialista em políticas de medicamentos Alcântara Bonfim reforça a sua tese: “Sabe-se que muitas das matérias primas utilizadas na fabricação de medicamentos entram irregularmente no Brasil. Sabe-se que a importação desses produtos é meramente burocrática e cartorial. Sabe-se que muitos desses produtos vem da China e de outros países. E só o fato da Anvisa não ter conhecimento dos insumos utilizados e a forma da sua utilização já se constitui uma infração gravíssima! É um crime grave previsto na nossa legislação, porque toda matéria-prima utilizada na produção de medicamentos precisa antes ser certificada e aprovada pela Anvisa. E se a Anvisa não faz testes nem para certificar a qualidade dos insumos, que sabemos que as indústrias estão importando de forma irregular, então como se pode garantir a qualidade dos medicamentos fabricados com esses produtos?”Também a fala do farmacêutico-bate-meta que gravei na farmácia da Grande São Paulo reflete a verdade que existe por trás dos esquemas da bonificação dos medicamentos genéricos e similares, sejam as que ganham fama e caem no gosto popular através da propaganda enganosa ou as que apenas sobrevivem nas prateleiras das farmácias graças à empurroterapia. Ao ser questionado sobre a eficácia do genérico Diclofenaco Potássico 50 mg com 20 comprimidos do Cimed, comprado por apenas R$ 1,36 e revendido por R$ 10,00 (ou R$ 8,00 com descontos), o farmacêutico-bate-metas responde: “Vai depender da qualidade da matéria-prima. Mas se o produto está aí e tem o registro da Anvisa é pra gente vender!”Nos vários rankings apresentados a seguir, o leitor precisa considerar o nome dos laboratórios e respectiva posição: 1 – ranking de vendas de beós genéricos e similares; 2 – ranking dos beós genéricos e similares interditados pela Anvisa; 3 – ranking das fraudes das losartanas e dipironas genéricas bonificadas; 4 – ranking da trocação enganosa dos medicamentos da receita nas 120 farmácias pesquisadas para este livro;Para o leitor entender como funcionam os esquemas da enganação do outro lado do balcão basta observar que os laboratórios com destaque no ranking de vendas são os mesmos no ranking de interdição da Anvisa, que são os mesmos no ranking das losartanas e dipironas bonificadas fraudulentas, que são os mesmos que ocupam posição de destaque no ranking da trocação enganosa das receitas.Depois de analisar os rankings dos laboratórios, o leitor precisa atentar para dois pontos importantes que vai fazer toda a diferença na hora de comprar um medicamento: 1 – não cair na lábia do balconista ou do farmacêutico porque eles têm metas de venda a bater, recuse a troca do medicamento da receita ou que você solicitou por similar oferecido como igual, melhor ou mais barato porque são mais caros; 2 – ao comprar um medicamento genérico procure dos laboratórios com preços mais baratos e que não aparecem nos rankings de fraudes, entre eles: Medley, Aché, Sandoz e Novartis.Só para o leitor ter uma ideia da diferença de preços, mesmo entre os genéricos, o anti-inflamatório Diclofenaco Potássico 50 mg com 20 comprimidos, um dos mais consumido no Brasil, é vendido nas farmácias do centro de Foz do Iguaçu (em maio de 2024) por R$ 10,90 (Medley), R$ 13,00 (Cimed), R$ 15,39 (Teuto) R$ 19,90 (EMS). Vale observar que os mesmos genérico dos mesmos fabricantes variam de preço conforme a farmácia: por exemplo o Diclofenaco do Medley foi encontrado por R$ 10,90 e por R$ 12,00. Já o do Cimed foi oferecido por R$ 13,00 e R$ 14,50. Compare que o produto do EMS, segundo colocado no ranking de interdição da Anvisa (Grupo NC), custa praticamente o dobro do genérico do multinacional Medley, laboratório que não aparece em nenhum ranking de interdição.O ranking dos laboratórios com genéricos e similares interditados é resultado de pesquisas, em maio de 2024, no ineficiente e incompleto portal da Anvisa. A maioria das interdições aconteceram entre 2016 e 2023 e o site não disponibiliza dados antigos ou mais recentes. Interdições de 2023 e 2024 são quase inexistentes, não por falta de fraudes no setor, mas por pura ineficiência da Anvisa e das vigilâncias sanitárias estaduais e municipais que em 99% dos casos só agem e fiscalizam medicante denúncia ou solicitação do Ministério Público no caso de alguma investigação.É importante ressaltar que a busca de dados na Anvisa —seja presencial ou online— é coisa surreal. Obter informação sobre fraudes em medicamentos na central da Anvisa em Brasília é coisa impossível e até parece que a instituição pública existe mesmo para sonegar informações esconder o desserviço prestado à população. Por exemplo a solicitação de informações por e-mail — sempre exigidas pelos servidores da Anvisa e visas, obviamente para se livrar dos solicitantes— quase nunca são respondidos.O laboratório Brainfarma-Neo Química (mesmo grupo) ocupa o primeiro lugar no ranking com 33 genéricos e similares interditados pela Anvisa (veja o resultado completo no site www.farmafia.com.br). A segunda posição é do laboratório paranaense Prati-Donaduzzi que tem 29 interdições. O Grupo NC (que representa os laboratórios EMS, Germed, Multilab e Nova Química) é o terceiro, com 28 produtos interditados.As demais ocupações no ranking de interdição são dos laboratórios Teuto com 26 produtos seguido pelo Cimed com dez pelo União Química com sete produtos interditados.Também as primeiras posições do ranking das losartanas e dipironas interditadas (testes realizados em 2017 pelo Centro de Estudos e Desenvolvimento Analítico Farmacêutico (Cedafar) da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais a pedido do programa Fantástico da Rede Globo) são ocupadas pelos mesmos laboratórios que despontam no ranking de interdição de genéricos da Anvisa, ou seja: o Neo Química, o Teuto, o EMS, e o Prati-Donaduzzi.Como matéria-prima importada da China ou Índia, os genéricos apresentaram os mesmos resultados insatisfatórios. As marcas de Losartana Potássica foram reprovadas por problemas de dissolução dos comprimidos (que dificulta a absorção pelo organismo).No entanto, os testes constataram caso grave de fraude, comprovando que os genéricos mais caros empurrados nas farmácias são do pior fabricante, o EMS: o Losartana e o Dipirona desse fabricante apresentaram teor de princípio ativo inferior ao que é obrigatório.Só para o leitor ter ideia como os esquemas da bonificação e da empurroterapia influenciam diretamente na qualidade duvidosa e preços mais caros dos produtos empurrados nas farmácias, o EMS é o primeiro colocado no ranking dos laboratórios de genéricos mais oferecidos nas 120 farmácias pesquisadas. E o Dipirona, o Diclofenaco de Potássico e o antibiótico Ampicilina do EMS aparecem nos primeiros lugares.Conforme a pesquisa que simulou a compra com receita médica dos genéricos Ampicilina, Diclofenaco Potássico e Dipirona e envolveu 120 farmácias (a pesquisa foi gravada com câmera escondida e a compilação de trechos está disponível no site www.farmafia.com.br) de SP, PR, RJ, RS e Brasília, o Grupo NC, que representa o EMS e o Multilab lidera em absoluto: o genérico Ampicilina da marca EMS (é o mais caro das farmácias) foi oferecido 62 vezes. Já o Ampicilab (que pertence ao Grupo NC) foi trocado de forma enganosa —porque foram oferecidos como “genérico mais barato”— aparece 41 vezes.O similar Neo Ampicilin (Neo Química) foi trocado pelo genérico oito vezes, seguido pelo genérico Ampicilina do Eurofarma oferecido três vezes e pelo Teuto, apenas uma vez. Os vendedoras agiram de má fé inclusive fraudando a prescrição médica: em quatro situações trocaram o antibiótico ampicilina pelo amoxicilina sem ao menos avisar o falso paciente.Conforme a pesquisa, os consumidores têm mais vantagem na compra do Diclofenaco Potássico: em 35 farmácias foram oferecidos o genérico do Medley (por praticar preços mais baratos e não aparecer nos rankings de fraudes). O SEM aparece sete vezes, o Aché cinco e o Prati-Donaduzzi três vezes. Os genéricos do Eurofarma e Sandoz, que concorrem com o Medley em qualidade e preço (também não aparecem nos ranking de fraudes) foram oferecidos uma única vez.Também no caso do Diclofenaco Potássico genérico os vendedores agiram com má fé duplamente em 17 farmácias e substituíram o medicamento da prescrição com princípio ativo diclofenaco potássico por similares bonificados com diclofenaco sódico na composição. O Clofen S do Cimed, por exemplo, foi empurrado 12 vezes como sendo genérico Diclofenaco Potássico: o beozão do Cimed (diclofenaco sódico 50mg com 20 comprimidos) custa R$ 15, 40 enquanto o genérico do Medley sai por R$ 11,00 (preços em maio de 2024).No ranking da trocação das dipironas genéricas pelas similares, a Dipimed do Medquímica foi a campeã: o similar foi oferecido como genérico em 27 farmácias.A genérica da marca EMS, a mais cara das farmácias, aparece 21 vezes, seguida pela marca Medley (18 vezes) e Aché (sete vezes).O genérico da receita foi trocado nove vezes pelo beó Dorfebril do Cimed, pelo Nofebrin do Legrand (11 vezes) e por similares de vários outros laboratórios (veja o resultado completo no site www.farmáfia.com.br).A câmera disfarçada de botão já estava ligada do outro lado do balcão quando chegou um vendedor da Cimed na filial da farmácia em que trabalhei em 2018 na Grande São Paulo. Gravei a negociação do farmacêutico-gerente-balconista que compra o genérico Diclofenaco de Sódico 50mg com 20 comprimidos por apenas R$ 1,29. Também tirei xerox da nota fiscal para comprovar o absurdo esquema de bonificação: o produto era vendido por R$ 10,00 ou por R$ 8,00 (caso o cliente menos otário pedisse desconto).
Fabricante de beós revela que não tem apreço pela prescrição médica
Em um outro trecho de entrevista, o dono da Cimed revela que é avesso à prescrição médica. Veja a real consideração de João Adibi com o receituário médico:
“A pandemia revolucionou o atendimento médico porque agora você consegue pegar uma receita digital. Tem coisa mais retrô do que chegar à farmácia com um papel? Isso é uma coisa esquisita!”.A principal preocupação da Cimed é cobrar as metas de venda dos vendedores, como bem diz João Adibe neste trecho da entrevista: “Eu sou um cara que nos últimos cinco anos eu não aceito não pagar bônus! Eu não aceito! O vendedor que entra na Cimed hoje, ele entra pra ganhar bônus! O bônus é que vai dar a vida que ele quer. O brasileiro não tem que ter o trauma de ‘eu vou ser mandado embora!’. Por que saiu uma pesquisa aí que diz que o brasileiro tem mais medo de ser mandado embora do que de morrer! Quando o vendedor chega na Cimed ele recebe muito treinamento em vendas. E 100% da minha força de vendas são autônomos, porque o autônomo acorda de manhã e quando liga o carro já está devendo e precisa vender! O vendedor da Cimed tem que ser mala! O atendimento ao cliente acaba, mas ele continua oferecendo. O cara já parou de comprar mas o vendedor fica ali: ‘você não quer mais isso, você não quer mais aquilo?’ Quando começamos a aplicar esse método de venda, dentro dos indicadores que a gente esperava, em três meses nós trocamos 40% da força de venda! O vendedor tem que se preparar pra vender. Vender não é só preço e prezo! Vender é uma arte!”
Adibe revela que embalagens custam mais que os insumos para fabricar genéricos
João Adibe revelou em outra entrevista de canal do Youtube que as embalagens de muitos genéricos fabricados pela Cimed custam mais que a própria formulação do produto.
Exemplo claro disso é a vitamina Lavitan e o genérico Diclofenaco Potássico: produzidos com matéria-prima importada da China, a caixa da Lavitan por exemplo custa cerca de R$ 9 às farmácias que revendem a farinha chinesa por preço que varia entre R$ 30 e R$ 50.
Farmácia compra genérico Cimed por R$ 1,29 e vende por R$ 10
Também o Diclofenaco Potássico genérico da caixinha amerela é fabricado com insumo chinês talvez mais barato que amido de milho. Na farmácia em que o autor do livro Farmácia: do outro lado do balcão atuou como balconista para investigar, em 2018, conseguiu gravar a negociação do do gerente com o representante da Cimed que vendeu a caixa do antiínflamatório genérico por apenas R$ 1,29.
No entanto, o genérico comprado por apenas R$ 1,29 era vendido por R$ 10 (nota fiscal acima) e balconistas e farmacêuticos ganhavam propina de 10% para fazer a “trocação” (jargão de balcão de farmácia) da receita para bater as metas de venda e aumentar o salário.